As lições que devemos aprender com Santa Maria
A tragédia de Santa Maria pode ser a tragédia de qualquer uma das 5.600 cidades brasileiras. Não goza Santa Maria de especial aptidão para atrair tragédias envolvendo em clube noturno fogo, excesso de pessoas e condições de seguranças aparentemente inexistentes.
Morreram 237 pessoas. Quase todas jovens, muitas nem chegaram a celebrar seus 20 anos de vida e sua grande maioria era formada por universitários, pessoas que conseguiram ultrapassar os grotões do ensino médio e arrancaram com muito esforço seu lugar na vida acadêmica.
Além das costumeiras repetições de imagens de parentes desesperados lamentando a saída de cena de seus mortos amados, as autoridades do município de Santa Maria, do Estado do Rio Grande do Sul e do país inteiro, se revezam em apontar os culpados: a banda de jovens gaúchos e os donos da Boate Kiss. O Corpo de Bombeiros fica mal na foto: segundo o Comandante da Corporação, existem somente em Santa Maria, mais de 2.000 pedidos de fiscalização de comércios pendentes para emissão de alvarás. Ou seja, teoricamente, a qualquer momento uma dessas centenas de lugares poderá voltar ao noticiário pela porta de incêndio e… com centenas de mortos.
Estados como o Rio de Janeiro e São Paulo, além do Distrito Federal, fazem mutirão de fiscalização de bares, teatros, cinemas e casas noturnas em geral para ‘verificar’ se a documentação ‘está em dia’, se possuem alvará de segurança do Corpo de Bombeiros, se possuem saídas de emergência. E, caso não tenham, lacram-se as portas. Simples assim.
Mas será tão simples assim?
Antes de começar o espetáculo da apresentação de novos projetos de leis, regulamentos e portarias visando dotar de mais segurança os lugares citados, algumas coisas simples poderiam ser feitas desde logo:
1) Exigir que cada bar, teatro, cinema e casa noturna (começando com estes estabelecimentos comerciais e de entretenimento), afixe em diversos lugares do ambiente placas sinalizadoras indicando a localização de saídas de emergência do local, bem como a localização e a quantidade de extintores de incêndio acessíveis em caso de incêndio;
2) Exigir que seja impresso nos cardápios mapa da localização das saídas de emergência, da localização e da quantidade de extintores de incêndio, bem como uma apresentação clara sobre como se usam tais equipamentos e, ainda mais, oferecendo três ou quatro recomendações de como o indivíduo deve agir em caso de incêndio: não sair correndo desesperadamente, não procurar os banheiros, procurar sair se abaixando para poder ter mais acesso de oxigênio nos pulmões, etc.
3) Divulgar, ao menos 3 vezes por ano, em cadeia de rádio e televisão, como publicidade governamental de utilidade pública, peças educativas sobre como agir em caso de incêndio em ambientes fechados e em ambientes abertos, com precisas instruções sobre o uso de extintores, a busca de saídas de emergência, etc.;
4) Orientar a população, em especial aquela mais assídua das casas noturnas, como bares, boates, teatros e cinemas, a ter dois telefones de emergência gravados na memória de seus celulares: os do Corpo de Bombeiros e da Polícia Civil. Estes números precisam receber maciça divulgação nos meios noticiosos, nas redes sociais na Internet e na publicidade institucional das operadoras de telefonia celular. Estas, devem ser solicitadas a criar um número com símbolo de fogo para fácil acionamento do Corpo de Bombeiros ou da Polícia Civil;
5) Aumentar, significativamente, as punições previstas em lei, dos proprietários de bares, casas noturnas, boates, cinemas e teatros que não seguirem à risca as normas legais de prevenção de incêndio, incluindo também a pena da venda do imóvel para indenização imediata das vítimas de incêndio em suas dependências, além de multas pesadas e a reclusão dos responsáveis por tragédias dessa natureza;
6) Proibição de qualquer tipo de apresentação cultural ou artística, em ambientes fechados, que se proponha a fazer uso de fogos de artifícios e assemelhados, responsabilizando-se criminalmente tanto os artistas quanto as empresas contratantes em caso de descumprimento dessa condição que deverá ser cláusula contratual para realização de tais eventos. (Não deve ser permitido qualquer tipo, uma vez que é difícil fiscalizar a marca e o tipo de fogo de artifício, suas características, podendo facilmente ser burlada a fiscalização. No caso de Santa Maria, a banda comprou o que era “mais em conta” e não o que era adequado a ambiente fechado, que cistava mais caro cerca de R$ 30,00 ou R$ 40,00).
Coisas simples, nada de extraordinário.
Mas que podem evitar novas tragédias como a de Santa Maria, interrompendo precocemente centenas de vidas, ceifando filhos e filhas de centenas de pais e mães que encontram na dor e na fé seu principal refúgio. E, na indignação, seu maior consolo.
Autor: Washington Araújo
Fonte: Carta Maior