Redes sociais, verdade e fé
Cinquenta anos atrás, em dezembro de 1963, a Igreja Católica, ao realizar o Concílio Ecumênico Vaticano II, tratou o importante tema da Comunicação Social, com o Decreto Inter Mirifica. Focalizada como uma das maravilhosas intervenções da técnica no nosso tempo, a comunicação social com todas as mídias, é considerada como força de movimentação, não somente dos indivíduos, mas de toda a sociedade. Nesse curso de invenções admiráveis está o mundo cibernético. Uma revolução de impressionantes proporções que nos leva ao contexto impactante das redes sociais. Essa realidade, bastante contemporânea, foi especialmente refletida durante o 47º Dia Mundial das Comunicações Sociais, no âmbito da Igreja Católica, em todo o mundo, a partir da temática “Redes sociais: portais de verdade e de fé; novos espaços de evangelização”.
A Igreja sabe que sua missão evangelizadora não pode ser realizada com êxito nos tempos atuais sem o uso das mídias. Além disso, reconhece o quanto é importante, na tarefa de anunciar o Reino de Deus, contracenar nesse amplo e complexo mundo das comunicações em razão da verdade e da fé, dom que é preciso ser cultivado no coração de todos. Já no contexto do Concílio Vaticano II, quando eram inimagináveis as proporções e alcances dos avanços que estavam por vir, já se acenava para uma dimensão moral inerente aos próprios avanços tecnológicos. Essa dimensão moral não pode ser esquecida, sob pena de transformar ferramentas significativas na construção do bem e da verdade em instrumentos que destroem valores inegociáveis para a vida.
Indispensável, portanto, é que os operadores e usuários de meios de comunicação balizem suas atuações numa reta consciência que leve ao compromisso com o bem e a verdade, fundamental na construção da sociedade democrática e no respeito às diversas culturas. Quando se trata, por exemplo, do direito à informação, tão importante para o diálogo e construção da sociedade, são cruciais a investigação e a divulgação de notícias. Esse exercício hoje, com as redes sociais, firma-se como um cuidado especial presidido por preocupações e compromissos imprescindíveis. Não se pode, é claro, abrir mão das informações enquanto determinantes no progresso da sociedade, na dinâmica da formação e na admirável interdependência entre os membros da sociedade humana.
Nesse contexto, são impressionantes os intercâmbios, com inusitada rapidez, que podem produzir encaminhamentos com força de mudança, instituindo espaços para reflexão e opiniões. Vale lembrar a previsão clarividente do Concílio Vaticano II como regulação desses fluxos impactantes dos meios de comunicação. O documento Inter Mirifica sublinha que o honesto exercício do direito à informação “exige, todavia, que a comunicação no seu conteúdo seja verdadeira e, resguardadas a justiça e a caridade, íntegra; além disso, quanto ao modo, seja honesta e conveniente, isto é, respeite escrupulosamente as leis morais, os seus legítimos direitos e a dignidade de cada homem, tanto na procura de notícias quanto na sua divulgação”.
A atenção e zelo com o uso das redes sociais devem, portanto, favorecer sempre o diálogo, o nascimento de novas formas de comunidades e a construção da vida por meio de novas relações. Um horizonte, de fato, potencialmente rico, mas que apresenta uma série de exigências e cuidados. Pode ser um caminho para necessárias transformações sociopolíticas, permitindo a construção de estaturas mais democráticas e humanísticas nas dinâmicas das diferentes culturas. Para tal, esses espaços precisam ser bem usados, respeitando privacidades, ocupados de modo responsável e a partir do compromisso com a verdade, determinante para o progresso de toda a família humana.
As redes sociais constituem possibilidades permanentes para o desenvolvimento de relações, laços de amizade, busca de respostas e partilha de conhecimento. São parte determinante do tecido social. No entanto, e por isso mesmo, exigem redobrada atenção e compromisso com a verdade. A voz da razão, na avalanche de informações, nas possibilidades de participação e intercâmbios, não pode ser abafada. As argumentações, notícias e debates precisam ser bem fundamentados cultivando formas de discurso que não sacrifiquem aspirações nobres, insubstituíveis na busca do bem e da verdade.
Nesse caminho, a fé tem um lugar importante. Vivida, professada e anunciada no ambiente digital, ela é um compromisso da Igreja Católica na missão de cultivar os valores do Evangelho nos espaços midiáticos. Por isso, a CNBB está finalizando seu Diretório Nacional de Comunicação, uma contribuição significativa para que a verdade e a fé sejam sempre horizontes imprescindíveis para os caminhos dos diversos meios de comunicação.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte