João Batista nos ensina a esperar o Messias
Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra
2º Domingo do Advento – Ano B
Início do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus. Está escrito no livro do profeta Isaías: ‘Eis que envio meu mensageiro à tua frente, para preparar o teu caminho. Esta é a voz daquele que grita no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai suas estradas!” Foi assim que João Batista apareceu no deserto, pregando um batismo de conversão para o perdão dos pecados. Toda a região da Judéia e todos os moradores de Jerusalém iam ao seu encontro. Confessavam os seus pecados e João os batizava no rio Jordão. João se vestia com uma pele de camelo e comia gafanhotos e mel do campo. E pregava, dizendo: ‘Depois de mim virá alguém mais forte do que eu. Eu nem sou digno de me abaixar para desamarrar suas sandálias. Eu vos batizei com água, mas ele vos batizará com o Espírito Santo. Mc 1, 1-8
Dona Santinha, mulher das mais devotas, sentiu com clareza na oração, o Senhor a lhe dizer que no dia seguinte a visitaria. Largou o terço, o livro de rezas e saiu correndo da Igreja para arrumar tudo. Lavou a casa, encerou o chão, comprou flores e perfumou tudo. Afinal aquela não era qualquer visita, o próprio Deus se faria presente. Nem conseguiu dormir tamanha a ansiedade. Ainda era noite e já se posicionara à porta para acolher o ilustre visitante. Logo na primeira hora quem apareceu foi um mendigo, ainda por cima bêbado, ansiando por um gole de café. “Hoje não tem nada, espero Jesus. Vê lá se perderei tempo coando café para você…Já pensou se Ele chega e estou na cozinha?” Foi com palavras assim que Santinha afastou o homem. Pouco antes do almoço uma vizinha veio lhe pedir dois ovos, pois que em casa nada havia para comer. “Como posso ir ao galinheiro? Jesus vai chegar e já pensou o que Ele irá pensar de mim, vendo-me com as galinhas? Volte outro dia. Hoje não saio daqui por nada.” A mulher foi embora triste, sem saber o que seus filhos almoçariam. A tarde caía quando escutou um alarido na casa em frente. É que a adolescente que lá morava estava grávida e sentia fortes contrações. Sua mãe atravessou correndo a rua solicitando que levasse a filha até o hospital, pois por lá ela era a única que possuía automóvel. “Melhor chamarem um taxi. Jesus já deve estar chegando, não posso me ausentar”. A mãe voltou triste, sabendo não haver na bolsa nenhum dinheiro para a condução. A noite ia alta quando enfim se deu conta de que só podia ter ouvido errado. Esperara, toda aflita, o dia todo e nada. Dormiu cansada e frustrada. Dia seguinte amanheceu na Igreja. Em frente ao sacrário reclamava, chorando, por Ele não ter cumprido o trato. “Como você me diz que não a visitei, Santinha? Estive lá três vezes e em nenhuma delas fui recebido!”
Na preparação para o Natal, iniciada semana passada, temos hoje uma reflexão fundamental. A Igreja nos apresenta o começo do Evangelho de Marcos e nele, vamos encontrar um dos dois fatos básicos da história de João Batista. O primeiro deles, sem dúvidas que é o batismo de Jesus.
O segundo é este que está relatado nesse domingo: João é o homem da espera do Messias. Não essa espera que Dona Santinha achava ser cuidadosa, mas que de atenção não tinha nada, eis que só mirava o céu. A espera do Batista tem os olhos postos nas pessoas. É de dentre elas que virá o Messias.
Para compreender melhor essa passagem será preciso viajar no tempo para, à beira do Jordão, contemplar aquele grupo de pessoas ao redor do Batizador. Com ele estava uma pequenina parte dos israelitas, um povo escravizado sob o jugo dos romanos. Gente que ansiava profundamente pela liberdade e essa seria trazida pelo esperado Messias.
Isto fazia com que aquela pregação se tornasse, aos olhos das autoridades, subversiva e perigosa. Libertar Israel tinha dois significados muito claros para eles: o retorno à Roma dos invasores e a chegada de um tempo pleno de graça e salvação. Não foi sem sentido que logo depois o Batista perdesse, literalmente, a cabeça.
Aqueles eram tempos de espera e também o fato de que há mais de dois séculos não se tinha notícias de grandes profetas, era um reforçador dessa expectativa crescente, principalmente entre os pequenos e excluídos daquela gente.
É nesse contexto que surge João Batista, este homem tão especial. Aquele do qual Jesus irá dizer que nenhum entre os seres humanos é maior do que ele. Saído da provação do deserto, exatamente como o seu povo, que por ele havia peregrinado durante longos quarenta anos, lá vem ele anunciando que o Messias está próximo.
João é o homem da espera, mas não de qualquer uma. Para o Evangelho não vale a espera passiva da historinha de hoje. Aquela na qual se fica em casa aguardando a visita que vem. A espera do Batista, reparemos, é totalmente ativa. É uma esperança profética.
Recordemos que o profeta é aquele que sente os acontecimentos, a partir do olhar e do coração de Deus. A partir desse sentir profundo ele não consegue ficar calado, denunciando os desmandos do pecado e, principalmente, anunciando a boa nova da salvação.
A espera de João o leva à fronteira simbólica entre a cidade, onde vivia o povo e o deserto. É para o limite entre esses dois espaços, tão significativos para aquela gente, que os moradores da Judéia e de Jerusalém virão para encontrá-lo. Nessa fronteira ele se torna o mensageiro, postando-se à frente para “endireitar e aplainar os caminhos”.
Afinal será neles que irá transitar o Salvador. É uma espera que só se realizará caso seja geradora de conversão. Aguardando o Messias João vai se purificando naquelas águas, na medida em que também vão sendo limpos e convertidos os que dele se aproximam para o batismo.
Até aqui contemplamos alguns aspectos da bela cena. Há que se ir mais adiante. É necessário nos conscientizarmos, de que também somos homens e mulheres da espera e que vivem em tempos de espera. O Messias continua vindo e para reconhecê-lo, é necessária a mesma conversão que anunciava o Batista. Ninguém pode dizer que está imune a ela.
Um padre contava, não faz muito tempo, que uma pessoa chegou até ele em busca de um retiro. Ao indagar dela os porquês de estar ali, lhe respondeu que se sentia realizada como cristã. Alguém plenamente convertida, tendo já dominado todas as faltas e pecados. Queria o retiro para mais ainda se aperfeiçoar. O sacerdote lhe perguntou se havia desfeito as malas, pois que seria melhor que voltasse, eis que a experiência que daria, não era para pessoas que se consideravam tão boas, mas que estivessem ali em busca de conversão.
Pode ser que nossos “caminhos” não estejam tão retos e que tenhamos construído sutis atalhos para driblar a consciência. Quem sabe também haja neles algumas “pedras”, que estejam fazendo com que não caminhemos como deveríamos, nessa espera ativa que nos leva ao encontro do Menino Deus que vem. É provável que possa nos estar faltando atenção e cuidados…
O homem da espera, João Batista, sabe que não somos perfeitos e incita-nos para que também nos coloquemos em atitude de expectativa. Não é preciso que, como ele, se vá ao concreto do deserto, nem que se vista peles ou se coma gafanhotos. O que se faz necessário é que cada um leia e traga para a realidade da sua vida, a metáfora do deserto e da existência renovada.
Vida nova para que se faça mais atenta, na percepção de Deus chegando nas pessoas (até mesmo naquelas que nos pareçam chatas e que ainda não conseguimos amar o suficiente). A sabedoria do povo ensina que “quem espera sempre alcança”. Nada mais do que por isto a esperança é uma das três virtudes teologais.
Que João, o Batizador de Jesus, nos faça mais esperançosos para que vivamos, de forma mais ativa, a espera do nosso Deus que já vem chegando.
Pistas para reflexão durante a semana:
– O que tenho esperado da vida?
– A espera que vivo é estática (fico à porta de casa), ou só acontece internalizada dentro de mim? Ela me lança rumo ao outro, ao mundo?
– Como estar mais preparado para receber o Menino neste Natal?
1ª Leitura – Is 40,1-5.9-11
2ª Leitura – 2Pd 3,8-14
Fernando Cyrino