Jesus é o bom pastor que me reconhece

Publicado em 16/04/2016 | Categoria: Mesa da Palavra Notícias |


Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra 

Ano C – 4º Domingo da Páscoa 

 

jesus cordeiro
 “As minhas ovelhas escutam a minha voz, eu as conheço e elas me seguem. Eu dou-lhes a vida eterna e elas jamais se perderão. E ninguém vai arrancá-las de minha mão. Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior que todos, e ninguém pode arrebatá-las da mão do Pai. Eu e o Pai somos um”. Jo 10, 27-30

Em programas de treinamento nas organizações que objetivam atitudes e comportamentos nas equipes, não é raro que se use um exercício para que fique demonstrado como é terrível a falta de reconhecimento. Assim ele é feito: Pede-se a um participante, geralmente voluntário, que se ausente por um tempo da sala. Combina-se com os demais que quando do seu retorno todos agirão como se ele não existisse. Ninguém lhe dirigirá palavra e muito menos o olhar. Caso ele venha a falar algo com alguém, este o ignorará solenemente, agindo como se o excluído não existisse e estivesse ali próximo. Depois de algum tempo de exercício, a pessoa ignorada se mostrará angustiada e poderá mesmo, caso não se encerre a experiência, reagir mal. 

Ninguém é capaz de conviver bem com a exclusão. O ser humano está sempre em busca de reconhecimento. Os profissionais da área de comportamento costumam dizer tratar-se tal necessidade de uma “carícia essencial”. É como se cada um de nós tivesse dentro do peito um balde para receber esses reconhecimentos.

A cada vez que se é reconhecido é como se uma doce água de carícias enchesse o balde. Isto faz com que nos sintamos bem: pacificados, alegres, motivados, animados para a realização. Numa linguagem mais espiritual, poderíamos dizer: consolados.

Só que esse tal balde de carícias é todo furado. Por isto, quando se passa um tempo maior sem haver, por parte dos outros, algum jeito de nos reconhecer, a água terminará vazando e o balde logo estará seco.  Aí, sem essa carícia básica, nos tornaremos apáticos, violentos, chatos, preguiçosos, hiperativos, tristes, emburrados… Na linguagem espiritual poderíamos dizer que estaremos desolados.

Essa tal carícia, trata-se de uma questão importante, não tem nela o sinal de “mais ou de menos”. Ela poderá tanto ser positiva quanto negativa. Ou seja, nosso balde interior, quando se encontra faz bastante tempo seco, passa a sentir dificuldades em perceber que tipo de carícia está entrando nele. Passa a importar para ele somente estar cheio de algum tipo do líquido das carícias. A motivação delas, se boa ou má, deixa de importar. Passou a ser algo secundário.

Uma visita às prisões nos mostrará haver nelas muitas pessoas que, por não terem tido na vida carícias positivas, terminaram por buscar algum outro tipo de reconhecimento (carícias negativas). É aquela gente que só consegue ser vista (reconhecida) quando se torna um ser antissocial.

Jesus no Evangelho deste domingo vem nos falar desta realidade. Quer nos mostrar o que é este reconhecimento, sem o qual a vida se torna impossível de ser vivida plenamente. A imagem que usará e que não é tão simples para nós, eis que não temos por perto este tipo de profissional, é a do pastor. Não a de um pastor comum, mas daquele que cuida com carinho das ovelhas sob a sua guarda.

É claro que não se trata aqui de uma bucólica cena campestre. Jesus é o bom pastor e nós somos as suas ovelhas. Nós reconhecemos sua voz e Ele reconhece a cada um: história, vicissitudes, desejos, alegrias, tristezas e necessidades de reconhecimento. O Senhor sabe muito bem por qual tipo de carícias sente falta o nosso balde. E ao contrário das nossas que podem ser negativas, as que vêm dele somente poderão ser de Amor e misericórdia.

Mas há sempre o risco da acomodação. Confortáveis na posição de estar sempre sendo reconhecidos poderá haver o esquecimento, de que também somos pastores para as pessoas que passam pelos nossos caminhos. Sim, o Senhor nos delegou este serviço de Amor. Da mesma maneira que somos por Ele reconhecidos, somos chamados a distribuir reconhecimentos vida afora.

Reconhecer as pessoas amadas: filhos, pais, cônjuges, amigos é bem fácil. A coisa começa a complicar quando caímos em conta do grande número de pessoas com as quais convivemos, ou seja, partilhamos o pedaço de mundo no qual vivemos. Gente necessitada de um olhar, uma palavra, uma carícia. Quem sabe aquele que cuida da limpeza à volta e que de repente nem sabemos como é seu rosto, ou que cor tem seus olhos. Pessoas que nos servem no restaurante, porteiros…

Levando para mais além o olhar encontraremos os mais amados de Jesus, os pobres e excluídos. São os bêbados, moradores de rua, pedintes, drogados, prostitutas, travestis… Gente que nem é capaz de se lembrar mais que cor, cheiro ou som teria um bom reconhecimento. A escória da sociedade que tantos, para ter amainada a consciência, até preferiria que fosse eliminada.

E nem chegamos ainda às crianças abandonadas. Daquelas que na medida em que se aproximam do carro os vidros também vão sendo cerrados e o olhar se posta adiante, como que se recusando a lhes dar algum reconhecimento. Esquecidos que somos de que é impossível se viver sem eles.

Podemos imaginar como essa falta de reconhecimento será respondida por essas crianças desprovidas de carícia um dia, acaso sobrevivam (morrem muitos e bem cedo, infelizmente). Como receberam somente a indiferença ou, quando olhados, repulsa e medo. Somente saberão responder com carícia negativa. E o nome que damos a ela é violência.

Neste tempo Pascal, no qual tomamos consciência de quão reconhecidos pelo Ressuscitado somos, façamos uma parada e reflitamos sobre a capacidade que temos (presente de Deus) para reconhecer as pessoas. Mas fazer este inventário não é o bastante. É necessário verificar a quantas anda o uso que temos feito dessa competência (missão que Deus nos dá).

Pistas para reflexão durante a semana:

 

 

– Está cheio ou vazio o meu balde de reconhecimento?

– Como é o meu olhar para as pessoas?

– A quem mais preciso reconhecer?

 

 

Fernando Cyrino


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