A Voz do Pastor – ABR 2021
RESSUSCITOU, ALELUIA!
Cristo ressuscitou, aleluia!
Venceu a morte com amor! Aleluia!
Este é o nosso canto de vitória. Somos vitoriosos porque Ele venceu a morte. Somos triunfantes porque Ele triunfou sobre a dor. Nada supera a alegria desse renascimento. Não merecemos, mas Ele nos fez merecedores. A gratidão nos invade, a alegria toma conta do ser.
Tudo o que dizemos, hoje, se exprime em gratidão. Obrigado, Jesus de Nazaré, Filho de Deus, Cristo e Senhor de nossas vidas. Obrigado! Por vossa santíssima Paixão salvastes o mundo e a mim também!
Em Jesus, Deus morreu e ressuscitou.
Mas quem é esse que morreu e ressuscitou?
Enquanto a descrença avança e os sistemas de pensamento pretendem substituir uma fé, que para muitos já se encontra defunta, tudo leva a crer que vamos estacionar numa Sexta-Feira Santa contínua, que não permite a passagem ao Sábado Santo, muito menos à manhã radiante do Domingo da Páscoa.
Para muitos, simplesmente, Deus morreu. E não há nessa morte nenhum caráter restaurador. Para muitos, Ele simplesmente morreu, porque nós nos cansamos de mantê-lo vivo, às nossas custas. Além dos crucifixos artísticos que enfeitam nossas igrejas e frequentam muitos colares e cordões, pouco sobrou. Para um número de pessoas que ainda insiste na ideia básica e central da Redenção – Ele morreu por mim e em meu lugar – sobram muitas outras para quem a Páscoa é apenas a festa de coelhos que botam ovos. E nós ainda ridicularizamos as superstições dos povos da antiguidade, não é?
Os novos sistemas de pensamento que tentam substituir uma teologia considerada defunta, já relegada a uma espécie de curiosidade arqueológica, apenas constatam que todo o enorme edifício cristão se ergueu na tumba de um Deus, cuja morte continua sendo testemunhada por muitos. Esse ateísmo, que toma a dianteira em muitos setores da sociedade, configura uma nova visão de um mundo que deva se acostumar a viver sem Deus.
Esse ateísmo é propagado em todas as esferas e por todos os ângulos, como a morte de Deus.
Mas não é o que acabamos de celebrar? Não é o que o que o Canto da Verônica nos anuncia todo ano? Curiosamente, e desde aquela Judeia empoeirada do ano 30, constatamos a morte, mas nos custa experimentar a ressurreição.
“No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao túmulo de Jesus bem de madrugada, quando ainda estava escuro. Ela viu que a pedra tinha sido retirada do túmulo. Então saiu correndo e foi encontrar Simão Pedro e o outro discípulo que Jesus amava. E disse para eles: “Tiraram do túmulo o Senhor, e não sabemos onde o colocaram” (João 20).
Pois é, os dois saíram correndo, mas também nem viram nem entenderam nada. Parece que, já naquela primeira manhã, só conseguíamos avaliar de forma concreta.
Isso nos leva a pensar no ateísmo moderno, um ateísmo tecnológico. Há hoje uma vivência religiosa, apenas na aparência, ainda colocada no leito da ortodoxia, mas traída. O “totalmente Outro” não é mais reconhecido como existente, mas como projeção e alienação. O que o ateísmo conseguiu implantar foi um relacionamento, no qual se nega toda possibilidade de relacionamento.
Nesse contexto secularizado, não mais se nega Deus: Ele não chega sequer a ser objeto de negação ou hostilidade. Nesse materialismo invasor, no qual o que era apenas previsível passou a ser descartável, a transcendência ganha contornos de vitória olímpica, e nada mais. Os santos são apenas atletas da fé que atingiram algum pódio olímpico. Tudo se tornou apenas objeto, presença concreta sujeita a representação, cálculo matemático, e apreensão científica, que tira de todo ser toda forma de mistério e ambiguidade. Não é uma pena que o homem tecnológico tenha perdido a integração mística em troca de uma certeza numérica banal, que só a matemática é capaz de dar? Não é triste que ele tenha dado a plenitude de sentido em troca apenas dos sentidos, num nivelamento que conduz ao desumano?
Esse nivelamento totalizante achatou a experiência humana.
Quando nos submetemos às exigências de produção, ao comércio do amor e da liberdade sob a tirania da mídia e do espetáculo, nada mais fizemos que correr, como os dois apóstolos, da narrativa de João, correr para concluir o que já haviam concluído, ou seja, é só a matéria que existe! Esse nivelamento pelo ponto mais baixo ainda vai matar as conquistas humanas que nos definiam como humanos.
Se não há mais lugar sequer para o humano, que dirá para Deus? Se tudo o que conseguimos em dois milênios de fé cristã foi apenas comprovar que o túmulo está vazio, o que irá sobrar de tudo? Vamos voltar a essa incrível capacidade de avaliar e valorizar o mundo pelo nível mais baixo? Então foi para isso que houve aquela Morte e aquela Ressurreição? Fazer as coisas se tornarem medíocres não são bons modos de considerar a nossa capacidade.
Queremos mais! Não queremos? Podemos mais! Não podemos? Como, então, nos contentarmos com tão pouco! O sentido da vida está no mistério da Morte e da Ressurreição de Jesus!
Deixo aos irmãos e irmãs o meu abraço fraterno e a minha bênção. Que o Cristo Ressuscitado, vivo, atuante e eterno, nos conceda o olhar refinado da fé, capaz de descobrir a sua presença onde os outros apenas percebem os sinais da civilização e apenas recebem os restos de um amor exaurido de seu vigor.
Irmãos e irmãs: Feliz Páscoa da Ressurreição! Que ela se repita em todos os dias do ano e da vida, até o dia em que o Ressuscitado mesmo nos receber às portas do seu Reino, para nos dizer: “Esperei-te desde o início do mundo! Por que demoraste tanto?!”
Um abraço Pascal planejado e desejado, desde o início dos tempos. Que o Cristo Ressuscitado, que resplandece resplendente, ilumine as trevas do nosso coração e da nossa mente. Amém!
+ Dom José Francisco Rezende Dias
Arcebispo Metropolitano de Niterói