Adentrar na comunhão da Trindade
A Trindade se revela para ser experimentada
Felipe Magalhães Francisco*
É preciso deixar de lado, um pouco, nossa tendência ocidental racionalizante, se quisermos compreender o mistério da Trindade. Percebam os leitores e leitoras o uso proposital do verbo compreender. Está para além do entendimento, capacidade intelectual. A compreensão pressupõe percepção que, por sua vez, pressupõe experiência. Racionalizar o mistério Trinitário é cair num lugar sem-lugar. A Trindade se revela para ser experienciada: somos convidados a adentrar no amor que Deus, uno e trino, é em si mesmo.
É nesse horizonte que devemos celebrar a festa da Santíssima Trindade. Não cedendo a tentação de querer entender, racionalmente, o mistério trinitário, compreender, porque experimentamos, a teo-lógica do amor-comunhão que nos chama à participação. Participar da vida divina, como cumprimento de nossa vocação humana, não porque galgamos com nossas próprias forças, mas porque é o próprio Deus que nos chama à sua comunhão. O amor quer ser amado e só se realiza amando. E é na gratuidade desse amor transbordante que nos associamos, quando dizemos nosso sim responsivo ao convite divino.
O mistério de Deus uno e trino é o primeiro artigo de nossa matéria especial, dedicada à reflexão sobre a Trindade. Nele, Antônio Ronaldo Nogueira parte da tradição joanina em nomear Deus como amor, compreendendo esse ser amor a partir da noção de relação, fundamental quando o assunto é a Trindade. Essa relação não é fechada em si mesma, mas aberta. E isso diz respeito à humanidade, pois ela é fruto do desejo amoroso de Deus, amor que sempre se transborda. É nesse sentido que compreendemos temas teológicos importantes, tais como a criação, a salvação e a santificação, tal como podemos perceber no artigo.
O mistério da comunhão trinitária é convite. Ajudando-nos a refletir sobre esse convite à comunhão, Sandra Sousa nos oferece o artigo A lógica trinitária do amor. Lida na perspectiva espiritual, a lógica do amor trinitário nos abre a novos tipos de relação: não apenas a nossa com Deus, mas com as pessoas. Pelo amor trinitário, aprendemos a lógica da gratuidade, que nos faz crescer, em qualidade, no modo como nos relacionamos, abandonando preconceitos, fechamentos e limites. Compreendemos, de modo profundo, a dimensão ativa do amor. Esse amor deve ser o selo da vida cristã, porque nascido do próprio coração da Trindade.
A forma como rezamos manifesta aquilo que cremos. Essa é uma antiga compreensão eclesial que, muitas vezes, pode nos passar despercebida. A lógica da oração cristã é sempre trinitária. Explorando essa temática, Daniel Reis nos propõe o artigo Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, recuperando, teologicamente, um gesto cotidiano para cristãos e cristãs católicos. Configurando o início e término de nossas orações, a Trindade é o elo que faz gerar em nós comunhão, de modo que toda a nossa vida seja trinitária.
*Felipe Magalhães Francisco é teólogo. Articula a Editoria de Religião deste portal. É autor do livro de poemas Imprevisto (Penalux, 2015). E-mail: felipe.mfrancisco.teologia@gmail.com.
Fonte: Dom Total