Caminhando com Jesus rumo à Paixão
Mesa da Palavra – Quarta-fei ra de Cinzas
Ensina-me a rezar, Senhor.
Livra-me da tentação da tagarelice.
De falar muito sem lhe escutar.
Que aprenda a arte do diálogo
e como amigos conversemos.
Escutá-lo no silêncio do coração,
apresentá-lo à minha intimidade.
Mergulhar em seu colo infinito
e depois partir para o serviço.
Ensina-me a dar esmolas, Senhor.
Que o pobre não baixe os olhos
ao receber o que lhe devolvo,
mas me fite de frente, como irmão.
Que a minha dádiva não humilhe,
mas faça crescer em dignidade.
Que aprenda a dar além de coisas
oferecendo-me ao que precisar,
ofertando do tempo e da atenção.
Ensina-me a jejuar, Senhor.
Mostra-me que além do sacrifício
reside a sua infinita misericórdia.
Que eu faça jejum dos sentidos.
Não permita que a boca diga
palavras inúteis e em excesso.
Fecha os meus olhos à malícia
e que os ouvidos não valorizem
boatos que nada constróem.
Que as cinzas na minha testa
falem-me da impossibilidade
de largar o egoísmo sem Você.
Ensinem-me que é na fragilidade
que me farei forte e caminharei,
marcado pela cruz, até o outro.
Totalmente livre como o é
Seu filho tão querido e amado.
Amém
Vamos entrando num tempo de maior interiorização. Uma ocasião rica em sinais e símbolos para nos ajudar na contemplação dos mistérios da Paixão e Morte de Jesus. Nesses quarenta dias somos convidados a tomar maior atenção conosco mesmos. Não somente dentro da dimensão espiritual, mas também considerando junto dela o nosso corpo.
Costumamos andar meio desligados dos sentidos. Uma grande parte dos dias podemos passar como se estivéssemos sonolentos, ou mesmo dormindo. Não nos damos conta de tanta coisa que acontece à volta. A Quaresma é uma estação para se ter maior atenção. Um tempo propício para cuidarmos dos cinco sentidos do corpo, através dos quais manifestamos a essência do que somos.
No Evangelho da Quarta Feira de Cinzas o Evangelista Mateus vem nos mostrar Jesus trazendo-nos três caminhos para o cuidado conosco mesmos. Ele nos fala da oração, do jejum e da esmola. Será através delas que somos convidados a adentrar, através dos sentidos, mais profundamente no mistério maravilhoso de Deus. Ao contrário do que nos prega a Pós-modernidade incentivando-nos ao individualismo, ser cristão é seguir nessa contramão e essas três dimensões, bem usadas, terão o dom de fazer com que saiamos de nós mesmos na direção do outro.
Expressões muito usadas, ou de sentido amplo acabam se tornando desgastadas. É preciso então que sejam energizadas para que produzam frutos. Reparem que isso é o que acontece com as três palavrinhas trazidas no Evangelho. Vale refletir aqui sobre o real sentido delas na nossa vida, revitalizando-as para que funcionem como boa estrada para o seguimento de Jesus nessa fase final da sua vida.
A oração precisa ir bem além da repetição de fórmulas. Rezar é tomar parte no mistério de Deus, entrar humildemente nele. Através das suas mãos mergulhar para o mais profundo das maravilhas que Ele nos for trazendo. Por isso a oração não pode ser algo mental somente. É preciso trazê-la para os sentidos. Ter a oração na cabeça é dirigi-la e se temos o controle dela, como será que Deus poderá conduzir a nossa mão? Deixar-se levar é um segredo da oração.
Dar esmola não é só enfiar a mão no bolso e dar aquele dinheiro que não nos fará falta. Muito menos se aproveitar do fato de haver desabrigados da inundação para ficar mandando coisas. Quem sabe até que algumas delas já deveriam ter sido descartadas. É dar daquilo que vale realmente para nós. Por isto, ao dar a esmola é necessário verificarmos o que nos custa. O que vale realmente na minha vida e que posso e quero dar para o outro? Poderemos descobrir que é a minha palavra que vale. Então será através dela que poderei dar a minha esmola. O tempo também nos é muito precioso. Dar do seu tempo pode ser o que vale na esmola. Dar do corpo, oferecer o ombro, um colo, um cuidado especial… O pobre também precisa ser visto numa dimensão maior. Pobre é todo aquele que precisa de mim e não somente os necessitados de bens materiais. Pode ser que o meu pobre a quem devo dar a esmola seja alguém de muito perto e que, em definitivo, não precisa de dinheiro ou de coisas assim. Tudo isto precisa ser refletido na esmola que iremos oferecer.
Jejuar não é fechar a boca. Precisamos ter em mente que Jesus não gosta da fome e não nos surpreenderíamos se encontrarmos por aí alguém que esteja jejuando com segundas intenções. Aproveitando a deixa para cuidar da silhueta. Jejuar é ter domínio de si mesmo. Manter controle sobre os sentidos não deixando que o instinto prevaleça. Tendo ordenados os seus afetos. Por isso a necessidade de se aproveitar esse tempo privilegiado, para jejuar de todas aquelas coisas que nos dificultam, ou mesmo nos impedem, de sermos mais abertos para o outro. Quem sabe o que eu precise nessa Quaresma seja de jejuar de algum capricho, de guardar raiva, de falar demais, de dar ouvidos ao que não constrói, de tocar o que não me faz bem, de ver coisas que nada me acrescentam.
Há sempre o perigo de pensarmos que essas três palavras só são importantes nesse tempo especial. Nada disso, o que faremos é usar esse período como fase de treinamento, ou de aperfeiçoamento, para que no ano todo essa atenção conosco mesmos, para nos abrirmos ao outro, possa ser melhor praticada.
Perguntas para ajudar na reflexão para a Quarta Feira de Cinzas
– Como está o meu nível de atenção para comigo?
– Das três palavrinhas da Quaresma qual aquela que sinto que Deus me pede mais cuidado?
– Quem conduz a minha oração?
1ª Leitura – Jl 2,12-18
Agora, diz o Senhor, voltai para mim com todo o vosso coração, com jejuns, lágrimas e gemidos; rasgai o coração, e não as vestes; e voltai para o Senhor, vosso Deus; ele é benigno e compassivo, paciente e cheio de misericórdia, inclinado a perdoar o castigo’. Quem sabe, se ele se volta para vós e vos perdoa, e deixa atrás de si a bênção, oblação e libação para o Senhor, vosso Deus? Tocai trombeta em Sião, prescrevei o jejum sagrado, convocai a assembléia; congregai o povo, realizai cerimônias de culto, reuni anciãos, ajuntai crianças e lactentes; deixe o esposo seu aposento, e a esposa, seu leito.
Chorem, postos entre o vestíbulo e o altar, os ministros sagrados do Senhor, e digam: ‘Perdoa, Senhor, a teu povo, e não deixes que esta tua herança sofra infâmia e que as nações a dominem.’ Por que se haveria de dizer entre os povos: ‘Onde está o Deus deles?’ Então o Senhor encheu-se de zelo por sua terra e perdoou ao seu povo.
2ª Leitura – 2Cor 5,20-6,2
Irmãos: Somos embaixadores de Cristo, e é Deus mesmo que exorta através de nós. Em nome de Cristo, nós vos suplicamos: deixai-vos reconciliar com Deus. Aquele que não cometeu nenhum pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nele nós nos tornemos justiça de Deus. Como colaboradores de Cristo, nós vos exortamos a não receberdes em vão a graça de Deus, pois ele diz: ‘No momento favorável, eu te ouvi e no dia da salvação, eu te socorri’. É agora o momento favorável, é agora o dia da salvação.
Evangelho – Mt 6,1-6.16-18
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “Ficai atentos para não praticar a vossa justiça na frente dos homens, só para serdes vistos por eles. Caso contrário, não recebereis a recompensa do vosso Pai que está nos céus. Por isso, quando deres esmola, não toques a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem elogiados pelos homens. Em verdade vos digo: eles já receberam a sua recompensa. Ao contrário, quando deres esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua mão direita, de modo que, a tua esmola fique oculta. E o teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa. Quando orardes, não sejais como os hipócritas, que gostam de rezar em pé, nas sinagogas e nas esquinas das praças, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo: eles já receberam a sua recompensa. Ao contrário, quando tu orares, entra no teu quarto, fecha a porta, e reza ao teu Pai que está oculto. E o teu Pai, que vê o que está escondido, te dará a recompensa. Quando jejuardes, não fiqueis com o rosto triste como os hipócritas. Eles desfiguram o rosto, para que os homens vejam que estão jejuando. Em verdade vos digo: Eles já receberam a sua recompensa.
Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, 18para que os homens não vejam que tu estás jejuando, mas somente teu Pai, que está oculto. E o teu Pai, que vê o que está escondido, te dará a recompensa.
Fernando Dias Cyrino
www.fernandocyrino.com