Deus habita no humano – A Trindade vive em nós
Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra
Ano C – 6º Domingo da Páscoa
“Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada. Quem não me ama, não guarda a minha palavra. E a palavra que escutais não é minha, mas do Pai que me enviou. Isso é o que vos disse enquanto estava convosco. Mas o Defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito. Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; mas não a dou como o mundo. Não se perturbe nem se intimide o vosso coração. Ouvistes o que eu vos disse: ‘Vou, mas voltarei a vós’. Se me amásseis, ficaríeis alegres porque vou para o Pai, pois o Pai é maior do que eu. Disse-vos isso, agora, antes que aconteça, para que, quando acontecer, vós acrediteis”. Jo 14, 23-29
Deus habitar em nós não significa que estejamos possuídos por Ele e assim tenhamos perdido a liberdade, conforme o medo desses imaginários catequizandos da historinha de hoje. Ter Deus em si traz o sentido de que se está sendo divinizado. Que se segue o caminho para se tornar santo. E Santo, proclamamos a cada Eucaristia, é o Senhor. Deus jamais tocará na nossa liberdade. Ter Ele dentro inclusive a reforça, na medida em que nos encoraja e anima.
Deus que faz morada em nós, tem o sentido de que assumimos a condição de filhos. E filho de peixe, diz o ditado tão conhecido, peixinho é. Deus em nós denota também que não fomos feitos para pouca coisa. Que não podemos e nem devemos nos contentar com a mediocridade. Somos filhos de Deus e Ele habita em nós. Gente, portanto, capaz de realizar coisas muito maiores do que aquelas que hoje fazemos.
Deus, o Amor, habita naqueles que aceitam sua Palavra. Trata-se aqui de um fato básico, essencial na nossa fé. Algo tremendo e que traz no seu bojo responsabilidades bem grandes conosco mesmo, com a comunidade e até com o mundo.
Somos mais de um bilhão e duzentos milhões de cristãos. Considerando os sete bilhões de habitantes da terra trata-se de minoria, mas ao se levar em conta tal número em si mesmo, se vê de imediato que é gente demais. Trata-se de seis vezes a população do Brasil.
Daí que precisamos nos perguntar. Será que estamos mesmo sendo conscientes dessa dimensão divina em nós e dos encargos que tal presença acarreta? Será que o mundo (pelo menos à nossa volta) não deveria estar melhor porque Deus, o Amor, vive dentro da gente?
O Amor não é um sentimento simplesmente, como algumas pessoas podem pensar. Vai muito além dele. Amar pressupõe movimento, ação para fora de si. Amar é se colocar ativo na construção do bem entre as pessoas. É ser capaz de largar o egoísmo estéril e gerador de uma falsa ilusão de felicidade e se fazer pacífico, justo e misericordioso.
A gente ama não por capricho ou obrigação, mas porque este é o nosso princípio e fundamento. Amar a todos e não somente às pessoas próximas e mais queridas. Amar também quem não conhecemos e mesmo aqueles com quem não conseguimos ainda conviver bem. Santo Inácio de Loyola ensinava, já tratamos disto aqui, que o Amor consiste em obras. Amar é dar e receber.
Para amar não é preciso estar colado às pessoas. Não se pode ser ingênuo. Há gente que pode não nos desejar por perto. Quem sabe existam outras que queiram nos fazer o mal. Enfim, há seres humanos com os quais, definitivamente, não conseguimos conviver. Manter-se sofrendo junto a elas somente pelo sofrimento não é Amor. Trata-se de masoquismo.
Amar pessoas assim complicadas é não lhes desejar e muito menos fazer-lhes o mal. É aceitá-las como seres humanos, nossos irmãos, portanto. É ter consciência de que não dá para tê-las, pelo menos por enquanto, por perto. Que vivam e nos deixem viver também. Há espaço no mundo suficiente para acolher a todos.
Aquele que ama não é desleixado e muito menos se deixa levar pelo esquecimento. Quem ama cuida. O jeito de Amor mais simples e concreto que podemos exercer é o cuidado. Cuidar é guardar o outro, ser seu “anjo da guarda”. Cuidar, mais além, significa tratar as pessoas na dimensão da liberdade que Deus nos dá. Guarda é proteção e não sentimento de posse em relação ao outro, seja filho, cônjuge, ou qualquer outra pessoa.
Este trecho do Evangelho nos aproxima do mistério da Santíssima Trindade. Nele podemos observar o Pai que envia o Filho e que é maior do que Ele, enquanto ser humano. Vemos também o Espírito Santo que na medida em que os completa, oferece-nos participar do Amor circulante e envolvente entre os Três.
Jesus nos deixa a paz. Não nos dá mera saudação de paz como costumamos oferecer às pessoas. Ele, mais que a saudação, nos entrega a sua paz e esta nada mais é do que Ele mesmo.
Esta paz, que é o próprio Deus, jamais será aquela da alienação trazida pela inconsciência dos problemas. A paz não é também a ausência da guerra. Muito menos será gerada pela sensação de segurança de se sentir protegido da violência, pelo poder das armas da polícia. Não é igualmente a paz de Jesus aquela propiciada pela vida defendida por muros, porteiros e câmeras de vigilância…
Por isto, a paz do Senhor pode se dar em meio à guerra e violências sofridas. Trata-se da consolação interior, profunda, que nos faz maiores do que tudo aquilo que o mundo possa fazer para nos agredir, ou diminuir. Ter essa paz é se saber competente para coisas muito grandes e assim encorajado(a) a partir para realizá-las.
Pistas para reflexão durante a semana:
– Como se reflete em minha vida a presença da Trindade?
– Em que necessito crescer no Amor?
– Gero paz à minha volta?