Mesa da Palavra – Todos os Santos
Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra
Solenidade de Todos os Santos – Ano B – 04-11-2012
Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte e sentou-se. Os discípulos aproximaram-se, e Jesus começou a ensiná-los: “Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus. Bem-aventurados os aflitos, porque serão consolados. Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus. Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus. Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem, e, mentindo, disserem todo tipo de mal contra vós, por causa de mim. Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus. Do mesmo modo perseguiram os profetas que vieram antes de vós. Mt 5, 1-12ª
Santidade é destino a ser buscado por todo filho de Deus
Era uma vez um rei muito bom. Seu castelo situava-se no topo da montanha mais alta do reino. Considerava a todos como filhos, lhes dedicando amor e proteção. Eram plenamente livres, mas o rei tinha receios de que tal fato os fizesse ausentes. Distantes da sua presença e carinho. Buscava um modo para demonstrar que se mantinha constantemente junto deles. Ideia que teve foi a de lançar linhas invisíveis e bastante tênues para ligá-los a ele. O que não levou em conta foi que a vida lá embaixo da montanha era bem agitada e as pessoas terminavam por se esquecer da bondade do rei. Isto as levava a fazer coisas erradas. Quando tal fato acontecia elas se distanciavam e a linha se rompia. Mas não nos esqueçamos: o rei era infinitamente bom. Sempre que constatava tal fato se entristecia, mas mantinha forte a esperança de que aquele seu filho se arrependesse e viesse buscar seu perdão. Este jamais era negado. Feliz o rei corria a amarrar a linha de novo. Só que aí começou a acontecer algo interessante. A cada novo nó na linha, ela se tornava menor. Trazia aquela pessoa que errara para mais perto do rei. Passado algum tempo havia tantos laços que ninguém mais estava longe. A tal linha invisível tornara-se supérflua. Ao perceberem essa nova realidade os filhos caíram em conta de que o rei agora as podia considerar santas.
A festa de todos os santos convida-nos à lembrança daqueles nossos irmãos na fé que já se encontram vivendo as maravilhas da eternidade de Amor na presença da Trindade Santa. Ao aceitar tal apelo, quase que automaticamente, vem-nos à memória os santos que se encontram nos altares e dos quais somos devotos.
Celebrar a santidade só assim desta maneira é bem pouco. Esta festa quer nos levar a algo ainda muito maior e mais profundo. É preciso ir além. Deixar-se conduzir pelo tema para poder contemplar duas faces muito bonitas do Pai.
A primeira é o rosto da santidade de Deus. Só Ele é o verdadeiramente santo. Não é por acaso que em todas as missas proclamamos que “santo, santo, santo, santo é o Senhor”. Esta festa então, mais que celebrar a limitada santidade humana, quer enfatizar a santidade infinita de Deus.
É o Pai, por pura graça, que nos faz seus santos, trata-se de presente dEle. Não fora o Senhor ser santo não haveria sentido esta celebração tão bonita. Tornar-se santo, jamais pode ser considerado mérito humano, é dom do Pai. Somos criados para a santidade porque somos filhos do verdadeiro Santo.
Como reza o ditado popular que “filho de peixe é peixe”, é possível por analogia depreendermos que filho de Santo é no mínimo “divinizável”, ou seja, um ser passível de se tornar também santo.
Obvio que isto não tira o caráter de heroísmo dos santos venerados nos altares e de tantos e tantos outros anônimos e mesmo esquecidos. Ao acolher a graça eles a trataram como tesouro tão grande e precioso que nada no mundo foi capaz de afastá-los por muito tempo da presença amorosa de Deus.
Ao registrar as vidas dos santos não é raro que os biógrafos tendam a deixar bem mais evidentes suas faces da pureza e mesmo os milagres, em detrimento daqueles atos menos louváveis. O fato de quase sempre não terem sido registradas suas faltas, não significa de forma alguma que não cometeram pecados. Santidade e perfeição são conceitos bem distintos.
O grande diferencial é que eles jamais se conformaram com a ausência de Deus em suas vidas. Ao constatar que se afastavam da graça, logo corriam a pedir perdão. Ao fazer isto iam se colocando, cada dia mais perto daquele que é todo Santo. A cada retorno tornavam-se ainda mais íntimos, mais perto dEle.
Ao celebrar os santos no céu estamos também nos dando conta desta busca, como “filhos de peixe”, da santidade. O ser cristão pode ser resumido na busca da santificação. Por isto o Evangelho deste domingo, quer nos dar ferramentas para essa procura. Oferece-nos assim as bem-aventuranças. Elas são como que o nosso “manual de instruções”.
Importante ressaltar que elas não se configuram em categorias, ou graus hierárquicos das aptidões e merecimentos para o alcance da glória de Deus. Menos ainda devem ser vistas como “lista de prêmios” a serem distribuídos àqueles que se comportarem segundo estes critérios. Elas devem ser olhadas – e vividas – muito além deste horizonte.
É preciso que as sintamos como a maneira de Deus conduzir sua gente. O jeito pelo qual poderemos dele nos aproximar e, sobretudo a meta para a qual deverá ser guiada a nossa existência.
Outro tipo de visão equivocada da bem aventurança é aquela de se imaginar o bem-aventurado como alguma pessoa de sorte. Um filho especial e dono de alguns privilégios. Alguém blindado por Deus, protegido de toda mazela e sofrimento.
Nada disto. O bem-aventurado é todo aquele que caminha com o Senhor, tomando assim parte no seu Reino. É o santo. Aquela pessoa que, a partir do “manual” distribuído no alto da montanha, passa, mesmo com seus retrocessos, a pautar a existência pelos critérios de Jesus.
Pistas para reflexão durante a semana:
– Sinto-me bem-aventurado?
– Busco a santidade?
– Como lidar com um “manual de instrução que vai na contramão do que prega o mundo?
Fernando Cyrino
www.fernandocyrino.com