O Amor preenche toda a Terra, mas a humanidade não o compreende
Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra
4º Domingo da Quaresma – Ano B
Assim como Moisés levantou a serpente no deserto, do mesmo modo é preciso que o Filho do Homem seja levantado. Assim, todo aquele que nele acreditar, nele terá a vida eterna. Pois Deus amou de tal forma o mundo, que entregou o seu Filho único, para que todo o que nele acredita não morra, mas tenha a vida eterna. De fato, Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para condenar o mundo, e sim para que o mundo seja salvo por meio dele. Quem acredita nele, não está condenado; quem não acredita, já está condenado, porque não acreditou no nome do Filho único de Deus. O julgamento é este: a luz veio ao mundo, mas os homens preferiram as trevas à luz, porque suas ações eram más. Quem pratica o mal tem ódio da luz, e não se aproxima da luz, para que suas ações não sejam desmascaradas. Mas quem age conforme à verdade, se aproxima da luz, para que suas ações sejam vistas, porque são feitas como Deus quer. (Jo 3,14-21)
Era uma vez o Amor. Como sempre acontece, Ele não cabe em si e acaba crescendo demais. Desenvolveu-se tanto o Amor que passou a sentir uma necessidade imensa de tomar outros espaços, ir se espalhando. Não que tivesse orgulho, ou fosse presunçoso, o Amor não é nada disso. Ele não cabia em si, porque ansiava transbordar no coração das pessoas. E foi desse jeito que o Amor veio para o mundo. Ele chegou como uma chuva fininha e constante, que vai caindo a molhar a tudo e a todos. Até que houve uma hora na qual a humanidade se viu encharcada de Amor. Só que a gente não compreendia o que estava se passando. Achava ser aquele Amor algo que nem era tão bom. No fundo tínha medo de que o Amor fosse atrapalhar, só dar trabalho e obrigações. Foi assim que teve início o processo de se desvencilhar dele. Enxugavam-se do Amor e iam se tornando secos. Um dia, friamente, tomaram a decisão, terrível, de matar o Amor. O que não sabiam é que Ele nunca morre. O Amor ressuscita sempre no coração da gente. E a chuva fininha e constante continua transbordando sobre a Terra.
O trecho do Evangelho de João, neste quarto domingo da Quaresma, vem nos falar do sacrifício na cruz de Jesus. É um anúncio da sua morte, feito obviamente à luz da ressurreição. A maneira como João posta este anúncio, pode nos dar a impressão de que tudo estava já definido e que o Filho iria mesmo sofrer a morte na cruz. Pensar assim gerará em nós a imagem de um pai sádico e frio, que quer a morte do seu Filho. Nenhum pai, muito menos Deus desejaria que seu filho sofressse tanto e morresse.
Precisamos compreender que não é Deus quem quer o sacrifício do seu filho. É o coração duro dos homens que fez com que “fosse levantado”. Não fosse assim a salvação sem dúvidas que poderia ter acontecido de várias outras maneiras.
O fundamental aqui nesse Evangelho, é que caso acreditemos nele teremos a vida eterna. Crer em Jesus não significa acreditar na sua morte. Esta é fato histórico e incontestável, não necessitando de fé. É muito mais crer na sua vida, em sua Palavra, como um todo. A morte na cruz é mera consequência, daquilo que acreditamos que é a Ressurreição e que nos leva, também nós, para a vida eterna.
A vinda do Filho ao mundo se dá por causa do Amor. Aqui nos encontramos diante de um ponto fundamental da nossa fé. Deus nos ama absurdamente e por causa deste Amor, não titubeia em enviar seu próprio Filho amado. Ele não o envia para provar nada. Afinal, nós o sabemos, o Amor não necessita ficar se provando.
O Amor de Deus vem naturalmente, porque quer ficar próximo dos seus filhos. E quando Ele, o Amor, chega o efêmero se faz infinito. O raso se vê profundo. O pequenino se transforma em imenso eis que a vida passa a não ter mais fim. O Amor se faz vida e esta se realiza eternamente.
Nosso coração é muito duro – haja vista o que fizemos com o Filho de Deus – e é possível que em alguns momentos da vida possamos ter tido a impressão de que o Filho veio para condenar o mundo. Algumas imagens bíblicas, fruto obviamente do coração endurecido desses nossos irmãos redatores, parecem nos mostrar esta condenação.
Por isto este trecho joanino torna-se para nós tão significativo e consolador. Deus não vem como policial para prender ou punir. Ele chega como bombeiro, a nos libertar das enchentes e incêndios da vida.
Ao conhecer o bem absoluto, que é Deus, o ser humano se encanta e adere a Ele. Não dá para se postar fora daquele que só é bondade. Mas o fato é que somos livres. Totalmente livres e Deus, absolutamente, não nos tutorará tratando-nos como se fôramos crianças.
Então, é preciso ter consciência, eis que tal coisa acontece, que diante do bem absoluto haverá sempre a possibilidade da negação. É neste fechamento para Deus que se configura a condenação. Ela parte de nós para Ele e não o contrário, como muitas vezes se pensa.
O inferno não ocorre porque Deus assim o quer, mas porque, no uso da liberdade toma-se a decisão de se afastar do bem. Pensando bem, logo se poderá ver, que será muito difícil que haja alguém, em pleno uso da razão, que seja capaz de negar a bondade absoluta de Deus e optar por se condenar. Caso vejamos alguém assim, diríamos tratar-se de um louco. E sendo doido será sempre alguém a ser acolhido, ainda mais amorosamente, no colo do Pai.
João termina nos dizendo que o mal procura a noite. O Padre João Batista Libânio sj comenta este trecho dizendo da inocência de João em relação ao escuro e à luz. Diz-nos que, ao contrário dos tempos de Jesus nos quais se buscava as trevas noturnas para se engendrar o mal, hoje em dia perdeu-se totalmente tal pudor.
O mal é feito durante o dia e sobre ele quanto mais holofotes houver a ofuscar as vistas melhor. Caso o evangelista conhecesse hoje a internet, a televisão e as bancas de revistas mudaria rapidamente a sua opinião.
Pistas para reflexão durante a semana:
– Creio no Amor absoluto de Deus por mim?
– Busco o bem na minha vida?
– De que maneiras tenho refletido este Amor de Deus?
1ª Leitura – 2Cr 36,14-15.19,23
2ª Leitura – Ef. 2, 4-10
Fernando Cyrino