Tudo o que é humano, até aquilo que parece ser de Cesar, pertence a Deus.
Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra
29º Domingo do Tempo Comum Ano A
Os fariseus fizeram um plano para apanhar Jesus em alguma palavra. Então mandaram os seus discípulos, junto com alguns do partido de Herodes, para dizerem a Jesus: ‘Mestre, sabemos que és verdadeiro e que, de fato, ensinas o caminho de Deus. Não te deixas influenciar pela opinião dos outros, pois não julgas um homem pelas aparências. Dize-nos, pois, o que pensas: É lícito ou não pagar imposto a César?’ Jesus percebeu a maldade deles e disse: ‘Hipócritas! Por que me preparais uma armadilha? Mostrai-me a moeda do imposto!’ Trouxeram-lhe então a moeda. E Jesus disse: ‘De quem é a figura e a inscrição desta moeda?’ Eles responderam: ‘De César.’ Jesus então lhes disse: ‘Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.’ (Mt 22, 15-21 )
Em meio à velhice ela recebia, semanalmente, variada cesta de frutas e linda braçada de flores. Os presentes, encomendados para o ano todo, chegavam-lhe frios e sem nenhum sentido. Neles não havia nada que lhe trouxesse o que mais queria: os filhos. Mera compensação pela falta das visitas. Houve um dia em que amanheceu ainda mais triste e deprimida. As enfermeiras, preocupadas, comunicaram à família o seu estado. Eles correram para o asilo e lhe perguntaram: Mãe, as frutas e rosas têm chegado? Balança a cabeça afirmativamente e lhes diz: “Meus queridos, não preciso desses presentes. O que sinto falta é da presença e do amor de vocês”.
Deus é como essa mãe do asilo a receber coisas embaladas dos filhos. Como a mulher, também não quer que levemos até Ele presentes, aos quais podemos dar o nome de oferendas e sacrifícios. O que o Senhor deseja de nós é muito mais. A Ele devemos dar o que já lhe pertence, ou seja, nós mesmos. A verdade é que Deus nos quer imensamente.
A frase de Jesus que nos é trazida no Evangelho de Mateus deste domingo, e que se tornou bordão famoso, pode ser lida e interpretada de diferentes formas. Para que se apreenda o seu sentido mais profundo, será preciso ir além do que está dito simplesmente. Esta sentença, para ser totalmente entendida, deve levar o nosso olhar para a vida de Jesus. Será na contemplação da sua existência, que compreenderemos o que ela deve significar para nós.
Há coisas que parecem pertencer a Cesar, mas sabemos que o que é de Deus (onde deve ser posto o acento principal da expressão) é muito maior. Vai muito além da religião, inclusive, pois o que é de Deus é tudo. Compreendida dessa forma a frase passa a significar que os “césares”, aqueles poderosos de qualquer tempo, também são devedores do culto, reverência, serviço e louvor ao Senhor da vida. Afinal tudo que é humano, mesmo que tenha a aparência de ser de Cesar, por estar sob a sua ilusória guarda, é de Deus.
Esta passagem tem dado margem, ao longo da história, para justificar inúmeros desmandos, violências e mesmo o poder autocrático de muitos “césares”. “Deixemos o ‘Cesar’ cuidar disso, como Igreja só precisamos cuidar do espiritual”. Nessa postura alienada e bem mais cômoda, larga-se mão do trabalho pela justiça do Reino. Com ela fica mantida arquivada, nas gavetas das sacristias, a dimensão profética de ser Igreja.
A dimensão política faz parte da dimensão religiosa e vice versa. Não que se deva assumir, enquanto Igreja e hierarquia aquilo que é de responsabilidade civil. Não é por aí a saída, da mesma forma que partidos religiosos, sejam de que matizes forem, não costumam ter bom fim. O cristão é ser político e assumir a luta nesse âmbito, faz parte do nosso batismo.
Tudo vem de Deus e vai para Ele. Tudo lhe pertence e nós, independente de sermos “césares” ou não, devemos tê-lo como absoluto da existência. Aquele que excede totalmente em valor. Aquele que a partir da sua presença tudo passa a ser relativizado. Por mais valiosa que seja a moeda, ela tem sempre um preço. O preço de Deus é o Amor e esse é impossível de ser comprado.
Pistas para reflexão durante a semana:
– A minha relação com o Senhor se dá na dimensão de coisas?
– Mantenho em espaços separados as dimensões religiosa e política da vida?
– Quem é o meu absoluto?
1ª Leitura – Is. 45, 1.4-6
2ª Leitura – 1Ts 1, 1-5b
Fernando Cyrino
www.fernandocyrino.com